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Juristas avaliam que votação sobre afastamento e recolhimento noturno de Aécio não deve ser secreta


A definição sobre como se dará a votação envolvendo o senador Aécio Neves (PSDB-MG)– se aberta ou fechada – está causando uma disputa entre parlamentares. Aliados, incluindo PSDB e PMDB, articulam para que a votação seja fechada, segundo determina o regimento interno do Senado, na expectativa de poupar os apoiadores do senador mineiro das críticas de eleitores. Do outro lado, a oposição, incluindo PT e Rede, quer que a votação seja aberta, conforme determina a Constituição Federal. Juristas consultados por GaúchaZH avaliam que, para respeitar a lei, a votação deve ser aberta.

O plenário deve julgar o futuro de Aécio a partir das 14h desta terça-feira (17). Senadores precisam decidir pelo afastamento ou não de Aécio do mandato e pelo recolhimento noturno em casa. Ele é acusado de corrupção passiva, por pedir R$ 2 milhões à JBS, e de obstrução da Justiça, por supostamente atuar no Senado para embaraçar a Lava-Jato. Duas interpretações estão em jogo para decidir a questão: as regras do regimento interno do Senado e o texto da Constituição.

Usado como base por aliados de Aécio, o artigo 291 do regimento interno do Senado, criado em 1970, prevê que a votação seja fechada em casos de prisão de senador, perda de mandato e autorização da formação de culpa.

A Constituição Federal chegou a prever votação fechada em ambos os casos, mas isso mudou com duas medidas. A Emenda Constitucional 35, de 2001, excluiu o voto secreto em casos de prisão de senador. Posteriormente, a Emenda Constitucional 76, de 2013, aboliu a votação secreta em casos de perda de mandato. Hoje, a Constituição, nos artigos 55 e 56, exige apenas “maioria absoluta” para votar prisão e perda de mandato de parlamentares.

O argumento jurídico usado por aliados de Aécio é de que a Constituição, por não dizer com todas as letras que a votação deva ser aberta, dá margem para que o Senado vote o caso de forma secreta. Já a oposição avalia que a Mesa Diretora do Senado deve se basear no texto atualizado da Constituição.

A manobra de aliados de Aécio é vista como “casuística” pelo diretor da faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB) e especialista em Direito Público, Mamede Said Filho. Ele explica que a Constituição Federal é mais forte do que o regimento interno do Senado “e qualquer outra lei”.

— A Constituição não determina mais votação secreta nos casos de perda de mandato e de prisão. Por que na decisão sobre afastamento de mandato e reclusão noturna, que são bem menos graves, vai-se adotar o voto secreto? Não tem sentido. O regimento deve ser interpretado à luz da Constituição— afirma.

Após ser contatada por GaúchaZH, a própria Assessoria Legislativa do Senado diz que o regimento interno da Casa “encontra-se em desacordo com o novo texto constitucional”, citando a emenda 76, de 2013.

Jurista e professor de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Justino de Oliveira avalia que a Constituição regula que, no caso de Aécio, o voto deve ser aberto. E diz que, caso o Senado “vire as costas para a Constituição”, a decisão do plenário pode ser revogada.

— Se o Senado decidir pelo voto secreto, a decisão pode ser vista como ilegal e inconstitucional, e revista na Justiça. Aí, o Supremo pode decidir que a votação seja refeita, de forma aberta. Na semana passada, a questão era ver a decisão que cabia a cada Poder. Agora, seria uma aplicação direta do texto constitucional, que é prerrogativa do Supremo. Estão em jogo os princípios de transparência e de publicidade — diz.

Na sexta-feira (13), um juiz de primeira instância chegou a conceder liminar (decisão imediata e provisória) para que a votação seja nominal. Conforme o jornal O Globo noticiou no domingo (15), a Mesa Diretora do Senado cogitou ignorar a decisão.

Para Oliveira, da USP, não cabe a um juiz de primeira instância interferir sobre o funcionamento do plenário do Senado.

— Isso é interpretação da Constituição, uma análise que cabe ao Supremo. É algo que não deve ser feito por juiz de primeiro grau — alega.

No caso de Delcídio, Aécio pediu votação secreta
O entendimento de que a votação seja aberta não seria inédito. Na votação da prisão do senador cassado Delcídio do Amaral, em novembro de 2015, o presidente do Senado à época, Renan Calheiros (PMDB-AL), tentou realizar a votação fechada. Contudo, parlamentares entraram com um mandado de segurança contra a iniciativa. O pedido foi aceito pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin com base na Emenda Constitucional 35.

Nesta segunda-feira, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) entrou com mandado de segurança de 17 páginas para exigir que a votação seja realizada de forma aberta. O texto, ao qual GaúchaZH teve acesso, ressalta que, à época, o próprio Aécio entrou no STF pedindo que a votação fosse secreta. Randolfe ainda afirma, no texto, que “não há razões para que pau que dá em Chico petista não dê em Francisco tucano”. Segundo a assessoria do parlamentar, o caso está sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes.

Fonte: Gauchazh


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